Um caminho liga um ponto a outro,
tem partida e tem chegada, e enquanto o percorremos, em cada passo nosso,
vivemos. A vida é pois uma viagem, mas sem a habitual pressa de chegar. Ainda
assim é avessa a descanso, não nos permite retrocessos, só avanços, e quanto muito,
numa dada encruzilhada, oferece a escolha do por onde, mas sempre continuar.
Neste meu caminho encontrei e
perdi pessoas, viajantes como eu, percorri e percorro grandes distâncias,
felizmente acompanhado. Não gosto de andar sozinho, senão por minha vontade, e
mesmo que a dada altura, assim possa escolher, nunca será por muito tempo. É da
minha natureza a convivência, o gosto pela partilha dos milagres que a estrada oferece,
o reconhecimento da beleza das coisas reflectida nos olhos de outros, sabendo
que só assim se amplia nos olhos meus.
A experiência do caminho traz o conhecimento,
o crescimento interior. Perder pessoas, por força de morte ou por
circunstâncias de vida, dificulta-nos a viagem, traz-nos um vazio que ao invés
de nos tornar mais leves, nos pesa na bagagem, como um novo lastro. Quem outrora
nos acompanhou lado a lado, parou, ou seguiu por via diferente, deixando-nos um
eco de passos, que vai enfraquecendo, até por fim se silenciar. Paradoxo. Que
silêncio ensurdecedor é este que me acompanha, que me faz olhar para trás?
Aqui chegado olho à minha volta.
Contemplo os campos, os rios e todas as formas de vida, tão perfeitas no seu
equilíbrio, vejo o mar imenso, sinto-lhe o sal, vislumbro o céu e seus astros, quase
lhes toco. Aqui chegado sufoco um grito, um apelo: Caminhantes que amo e perdi,
despedidas que nunca fiz, nem por um dia vos esqueço, pois em cada passo vos
levo, e o que eu sou sois vós. E se porventura a noite cair, mesmo a mais escura
das noites, nas estrelas vos encontrarei, vosso brilho seguirei. Estivemos
juntos na estrada, estejam também à chegada.